Presente - Hermano Noronha

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João Manuel Aleixo Pinto, morto em combate, Guiné 19/04/1974

Hermano Noronha foi presenteado em 2014 no Estação Imagem Mora com a bolsa de produção ao seu projecto 'Presente'. Para este trabalho Hermano acordou fantasmas e levantou o pó sobre um dos traumas do século XX português, a Guerra Colonial.
Passados cerca de 40 anos, Hermano tinha o objectivo de 'documentar o estado actual da memória sobre a Guerra Colonial no concelho de Mora'. É sobre esta ideia que se desenvolve o trabalho 'Presente'.

"Quase todas as histórias irão morrer, é inevitável… mas hoje a Guerra Colonial é uma história que continua a existir, que decorre, que ainda não se encerrou no silêncio do pó dos livros ou no recôndito dos documentos. De quando em vez emergem testemunhos sobre essa época que se quer acreditar passada e arrumada. Mas a verdade é que falar sobre esses tempos ainda dói."  Hermano Noronha, 2015

Rebentei uma mina no dia 23 de Março de 1967. Fui ao ar com a berlier, para aí à altura desses eucaliptos. O joelho nunca mais ficou bom. Éramos 28 dentro da berlier, dois ficaram logo apanhados. De outra vez deixaram-nos entrar na planície para só então abrirem fogo. O meu parelha foi logo ferido e ainda caíram, mesmo à nossa frente, umas 5 ou 6 morteiras. Já só pensava que nunca mais voltava a Portugal. O que nos safou foi outra companhia estar ali por perto, mas eles ainda aguentaram o contra-fogo durante cerca de uns 20 minutos, era como estar no meio de uma trovoada. Aquele foi o melhor tempo que passei, e o pior também. Quando vim embora quase que tinha saudades. Já lá voltei, faz aí uns 7 ou 8 anos, fui lá dar descanso a essas memórias. 

O que recordo são as amizades. O que sobra da guerra é uma camaradagem muito diferente de qualquer outra. Se voltasse ao início não me importava de voltar a passar por aquilo tudo. Eu hoje sinto-me bem, sinto que fui lá cumprir o meu dever. Era isso que se esperava de nós. Jacinto Bravo, Angola 1970-1972
Telefonaram para a Junta de Freguesia a pedir para dizerem à mãe que o filho pára-quedista tinha morrido. Ainda demorou mais de um ano para o virem cá enterrar. Eles estavam a ser seguidos pelos turras de modo que, quando a noite chegou, armadilharam o trilho. De manhã, quando foi desarmar a sua granada, pensando que não havia mais nenhuma tocou no fio de uma outra armadilha. Ainda deu três ou quatro passos e atirou-se para o chão. Infelizmente o fio prendeu-se na bota e a granada, do esticão foi no fio, e esta foi parar debaixo dele. Dizem que foi a sorte dos outros, que não morreram porque o corpo dele abafou a explosão. Só que rebentou-lhe no peito, foi o que me contaram os que o viram morrer. Angelina Rovisco Alfaia, mãe do caçador pára-quedista Francisco António Rovisco Ferreira, morto em combate, Moçambique 31/08/1970. 


Até ao dia 22 de Setembro é possível visitar a exposição no Centro Português de Fotografia no Porto.
Mais informações em: Estação Imagem,  CPF e Hermano Noronha

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